domingo, 24 de março de 2013

Caetano nos meus ouvidos

Eu não sei vocês, mas gosto dos shows nos quais as músicas respeitam - ou quase - a versão original. Do CD, LP, EP, ou do arquivo em mp3 ao qual me acostumo a ouvir e me afeiçoo. É claro que surpresas inspiradas são sempre bem-vindas, uma percussão inusitada, um solo de guitarra mais longo e alucinante... Mas eu gosto mesmo é de cantar, bem alto, junto com quem está lá no palco e, justamente por isso, fico um pouco irritada quando meus ídolos (?) resolvem mudar todo o andamento de uma canção adorada. Ontem, no Circo Voador, tive uma experiência que me deixou muito contente, e que até me fez rir, esquecendo um pouco dos litros de suor escorrendo pelo corpo, das pessoas que confundem show com night e ficam andando para lá e para cá e, principalmente, de uns seres humanos que pediam silêncio enquanto Caetano Veloso dedilhava os primeiros acordes das músicas mais calmas do seu disco novo, "Abraçaço". Caê no palco, lindo, cheio de vigor, violão em punho... Mas aí abria a boca e eu não conseguia escutar direito o que ele dizia porque seres humanos entoavam um grotesco "Shhhhhhhhhhhhh". Oi? Isso aqui é um show, pensava com meus botões. É o Circo Voador, melhor casa de shows do Rio, a comunhão entre artista e público é - quase - sempre perfeita, e até íntima. Todos pagam o mesmo preço, não existe cercadinho VIP, até quem está longe enxerga perfeitamente quem está no palco, a energia circula, famosos dançam loucamente esbarrando em anônimos, e o público sai daquela tenda branca com suor e alegria na mesma medida... Sem falar que o "Shhhhhhhhhhhh" dificultava ainda mais o entendimento do sibilar de Caetano. Enfim, desabafo feito, vamos voltar à história que me deixou alegre. A versão de "A luz de Tieta" que toca no meu iPod é ao vivo, e toda vez que ela toca eu começo a rir. Logo no início, a plateia, de tão empolgada, quer chegar logo ao refrão e atropela o doce bárbaro, que disfarça um risinho e embala a segunda parte da música. Há um choque aparente, mas a melodia segue e o coro explode na hora certa, ainda mais vibrante. No show de ontem, foi igualzinho e por um nanossegundo cheguei a cogitar se aquilo tudo não era um devaneio e eu não estava deitada com o fone no ouvido. Também, né? Caetano põe e tira o doce na boca das crianças: "Existe alguém aqui no fundo, no fundo de você, de mim que grita para quem quiser ouvir quando canta assim..." E a galera abre o gogó: "Eeeeta, eta, eta eta...". E Caê, meio risonho, deve pensar "Meu Deus, mas essa música é mais velha do que metade das pessoas que estão aqui. Ninguém aprendeu ainda?" e detona a segunda parte: "Toda noite é a mesma noite, a vida tão estreita", adiando a catarse da galera, que tem que esperar mais um tempinho para cantar "É a lua, é o sol, é a luz de Tieta-eta-etaaaaa". Também ri quando a estrela da noite, cheio de simpatia, se jogou no chão e fez caras e bocas para a plateia, e quando fez movimentos sensuais com o violão ao exaltar o funk melódico. Quanta vitalidade! Prefiro não comentar a crítica e a polêmica em torno dos moradores da "aldeia" Maracanã, mas adorei ouvir "Um índio", momento de puro prazer que, suponho, não faria parte do repertório caso o fato não estivesse (ou não?) nas capas de jornais. Descobri músicas que até então nunca tinha escutado, pulei, fotografei, aprovei e curti muito ser surpreendida por uma versão modernosa - e não muito diferente da original - de "Alexandre". Só queria conhecer a música que fechou a noite... Mas tudo bem, fica para a próxima. Fora isso, fica um abraçaço para quem não pôde ir ao show!

Um comentário:

João Miller disse...

Que delícia de texto! Me arrependi de não ter ido agora =(

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