domingo, 13 de outubro de 2013

Dias do adulto

Assim que termina o dia 12 de outubro, até um pouco antes do relógio dar meia noite, uma nuvem densa e infinita aterrisa na cidade. Vem direto dos arranha-céus, vestida de um cinza meio chumbo meia boca. Ela suga insistentemente tudo aquilo que parece já ter ficado pequeno. Pega das embocaduras abertas repletas de risadas aos mais sutis barulhos de risinhos espontâneos. Dizem que aparece assim, meio do nada, para ajeitar topetes, rasgos na roupa, sujeira na boca e feridas nos joelhos. E não é daquelas que chovem muito. Chove uma chuva meio garoa comportada, quase cronometrada. E enche de mais nuvem as cabeças leves.
Quando a gente acha que ela já foi, vem mais uma série. E são disformes, meio sem parecer com nada. Não parecem animais, nem rostos, nem dinossauros. Elas mudam sempre e amedrontam, porque continuam vindo, e vindo, e vindo. Parecem nunca terminar de vir. E vem em filas indianas, relampejando de insegurança quando finalmente chegam e se assentam. Se você chegar perto de uma, dá para ver que pesam de fato. E tem muita coisa perdida ali. Já foi encontrado um sapato com cadarços desamarrados. No meio de medos, gritos abafados, tempos desperdiçados. Era um sapato velho de pé pequeno. A sola gasta, cheia de barro e o bico furado. Mas ainda era branco, e a cor saltava no meio de tantos sopros acinzentados de pés enormes.
Certos de que sopram muito forte costumam concentrar nos que estão sentados. Esses que pestanejam desde cedo com olhos maiores. Se jogam em nuvens em direção a um tempo mensurado. Jogam fora ali mesmo retratos, tinta, papéis em branco. Esperando serem nuvem cinza chumbo e imponente, de chuvas regradas em meios céus nublados. Os que estão de pé são distraídos, com as mãos nos bolsos, cheios de papéis de balas ou anotações. São os baixos e também os altos. Não veem nada disso. Não sabem que dia é hoje, muito menos amanhã. Não sabem do clima, não sabem se viajam, se ficam em casa. Nem mesmo sabem muito bem o que querem, o que são, o que esperam. Só sabem que existe uma tal nuvem, densa e infinita, que todo fim do dia 12 de outubro volta a aterrisar na cidade. Mas nunca a viram passar.

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