domingo, 5 de janeiro de 2014

Velho ano novo

Cheguei a detectar qualquer sinal do número 14 pairando por aí, mas foi engano. Desde primeiro de janeiro, dia que serve para você olhar pela janela esperando ver algo de diferente, de repente um céu um pouco mais esverdeado como que em festa, de repente pessoas mais decididas pela rua. Ao contrário disso, a mesma cena. Pessoas sob um céu igualmente azul desfilando seus andares comuns, suas rotas já bem estabelecidas cambaleando um pouco para lá um pouco para cá mas sempre figurando entre os mais normais do planeta Terra - incluindo astronautas que estão ao redor do globo comemorando o novo ano. De todas essas pequenas esperanças de que tudo possa se tornar novo de um dia para o outro, mesmo você insuportavelmente parecido com o dia 31 de dezembro, a mais admirável delas é tentar ver sinais de primeiro de janeiro depois de acordar do ano anterior. Me sento à cama, coçando os olhos, lembrando de ontem, pondo a mão à testa, mas indo em frente. Procuro indícios de ano novo nas coisas mais estúpidas como na data do jornal impresso e no telefone celular, para que isso de alguma forma transforme o ano novo em matéria física. E eu podia tocar na tinta da capa do jornal, e o ano novo mancha o dedo e tem cheiro de capacho de porta.
A verdade é que ele começou tão 2013 ou 1999 como qualquer outro janeiro. Não falo nem com relação às chuvas, calor e deslizamentos. É sempre essa cara de desmaio, de quem não saiu da cama, nem sequer abriu as cortinas. Nem sequer destacou o calendário. Acho que para dar sinal de vida nova mais rápido o ano podia variar e começar em outros meses de vez em quando. Esse ano por exemplo, 2014, podia começar logo em junho para abafar essa ansiedade. Já ia estar na cara da Copa do Mundo. Ou em maio, quem sabe, uma temperatura civilizada nas ruas, um mês que não se gasta tanto dinheiro em presentes, ou em álcool, ou até em conta de luz. É certo que se mudasse o mês, para onde iria o carnaval e a quarta-feira de cinzas? Há uma conspiração dos astros para que estejam sempre lá, misteriosamente antes do ano começar de uma vez.
Que comece em janeiro mesmo. O ano novo é uma grande segunda-feira. É tudo igual mesmo, não tem exatamente cheiro de capacho de porta nem de nada muito diferente. É quando todas as coisas que não começaram estão querendo começar, é quando tudo quer ser mudado, tudo quer se tornar diferente. Tudo ficou para hoje. Não há novo sem gente velha, sem hábitos que começaram no ano passado ainda, sem ideias criadas desde agosto, sem trabalho duro desde março. Gente que está ávida desde sempre. O ano novo é um grande ano velho em estado de maturação.

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