Não importa. Porque é neste momento que percebo que uma dor esquisita vem martelando minha cabeça desde que acordei.
Todos me esperam na sala. Um corretivo mal disfarça as olheiras e um copo d'água serve de café da manhã. Munida dos costumeiros óculos escuros tamanho GG, saio para enfrentar o dia cinza, a ressaca e um temeroso almoço de família.
Almoço de família com ressaca: não existe combinação melhor.
Pega mal se eu continuar com os óculos. Pega mal se não quiser cumprimentar todas as pessoas presentes. Preparo o sorriso fake de sempre e, com aquela simpatia digna de Miss, respondo às perguntas de sempre:
- E aí, como tá a faculdade?
- Tá bem, tô gostando, me formo ano que vem já.
- Mas já? Menina, como passa depressa
- Pois é...
Quando acho que me livrei e vou pode procurar um canto para sentar e me empanturrar de petiscos, vem a segunda leva:
- E o teatro, tá com uma peça nova?
- Não, esse ano a gente tá fazendo projeto escola, com o "Alienista" mesmo.
- Ah, legal! Quando tiver outra me fala, hein. Adoro as peças da nossa artista.
- Hehehe, pode deixar, mas deve ser só no final do ano que vem mesmo.
Se eu tiver dez mil almoços de família num ano, vou responder no mínimo dez mil vezes estas perguntas. Digo no mínimo porque geralmente é mais de um parente que faz a entrevistinha básica com a priminha mais nova. Quando o almoço rende uma bebedeira de alguns tios mais idosos, sou obrigada a responder a mais terrível das perguntas-de-sempre-feitas-por-parentes.
- E aí, tá namorando, Marcela?
- Não.
- Aaah, mas não tem nem um paquerinha?
(Risinho forçado mais uma vez) - Ah, isso sempre tem, né, tio(a)?
- Muito bem, assim que é bom, que namorar que nada! Tem que curtir agora que é nova.
E eu fico com aquela cara de paisagem, meio concordando, meio não querendo dizer nada. Um dia vou ter a coragem necessária para responder: - Não, sou encalhada. Ninguém me ama, ninguém me quer. Também, homem hoje em dia é artigo raro no mercado. Ou é gay ou já tá comprometido porque a namorada não é louca de largar e ficar de mãos abanando.
Talvez chocasse tanto a família que nunca mais iriam tocar no assunto.
Mas, por enquanto, é isto que enfrento nos encontrinhos.
Mas, por enquanto, é isto que enfrento nos encontrinhos.
É claro que depois todo mundo fica mais relaxado e surgem assuntos agradáveis ou então viro plateia para um show de piadas de um tio, uma sessão de violão e cantoria, uma pecinha improvisada pelas crianças. E me empanturro de lasanha e doce, que é o melhor a se fazer. Mais tarde, quando o Faustão grita meio longe, os pratos vão sendo retirados, vejo que a dor de cabeça passou e olhos parecem normais. Acho que não conseguiria viver sem as perguntas-de-sempre-dos-familiares.
Um comentário:
meus domingos nunca são de lasanha. são sempre de tédio
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