segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Não-autorizado

Marcela Capobianco está resfriada. Mas não por isso deixou de ir à academia na noite desta terça-feira. O nariz deu uma leve escorrida lá para os treze minutos de esteira, mas ela fungou e continuou a caminhada forte. Alguns minutos antes, na sala de musculação, ela bateu com um aparelho na cabeça de uma adolescente. Morreu de vergonha, quis abrir um buraco no chão e nunca mais aparecer ali. A menina foi simpática, disse que não estava doendo e tratou de sair de perto. Marcela se perguntou o que estava fazendo ali, em meio a saradões e barrigas-negativas. Acabou caindo na gargalhada sozinha. Isso é bem do feitio dela.
João Miller evita esse tipo de ambiente correndo no playground do prédio em que mora. Ou pelo menos ele diz que corre. Pessoas próximas juram que ele está sedentário. O trabalho é pesado, às vezes ele rala literais 24 horas seguidas. Não à tôa, João anda cochilando em mesas de bar. Para ficar acordado, ele apela para doses de coca-cola. O rapaz conseguiu passar boa parte da adolescência e o começo da juventude sem beber refrigerante, mas a dureza do cotidiano o impediu de continuar uma vida regada a ice tea e matte leão, tão prejudiciais quanto os gaseificados. Marcela afirma que não toma refrigerante. Mas é mentira. Ela até rejeita no dia-a-dia, mas apela para um coca-zero bem gelada quando enfrenta uma TPM braba ou quando acorda de ressaca. Em viagens, os dois se entopem de refrigerante, e adoram experimentar sabores que ainda não chegaram ao terceiro mundo. Ela se apaixonou pela acidez da fanta limone na Itália, enquanto ele curtiu a doçura da fanta cassis na Holanda. 
Falando em doce, aí está uma unanimidade entre os dois. Na infância, ele escondia guloseimas dos irmãos e perdia a linha nas festinhas do melhor amigo de mãe doceira. Resultado: o dia seguinte era dominado pela dor de barriga. Ela aprendeu a fazer brigadeiro de panela quando mal alcançava o fogão. Quando passava as férias na casa da madrinha, no interior, exagerava com os primos e se jogava no doce ainda pelando. Resultado: em cada banheiro da casa havia uma criança "descarregando" brigadeiro. Ai de quem quisesse fazer xixi. Bons de garfo, João e Marcela cresceram brigando com a balança. Ou simplesmente não pisando nela. Exercício era chato e comer era muito mais divertido. Poucos sabem, mas ela sequer aprendeu a andar de bicicleta - e tem essa lacuna até hoje. Ele tinha dificuldades em se equilibrar nos patins por causa do pé chato, que nunca foi corrigido.
Semiconhecidos dizem que eles são completamente pirados. Já os amigos mais chegados estão acostumados às peculiaridades de cada um. Ainda mais quando tem bebida no meio. Todos sabem que ele está "altinho" quando começa a fazer malabarismos com garrafas. Ela tem mania de interagir com desconhecidos quando já tomou uns gorós. Esse hábito, aliás, espanta o tédio em nights chatas. Quem mais sacaria o celular para ouvir e dançar Khaled no meio de uma festa alternativa? Só mesmo esses dois jovens amigos... 

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