sábado, 28 de maio de 2011

Imagina só

Dia desses, passava sonolenta por Botafogo, sentindo frio no ônibus do metrô, quando vi, na calçada, uma colega dos meus tempos de aluna da Unirio. É, pois é, eu já estudei em faculdade pública... Parece que foi em outra vida, apesar de nem fazer tanto tempo. Fiquei ali, observando a ex-colega, que com certeza não se lembraria de mim - e eu também levei uns minutos para recordar o nome dela -, esperando o ônibus dela. Como aquele caminho leva à Unirio, imaginei que ela estaria, pelo horário, atrasada para a primeira aula do dia. Não sei pra quê fui imaginar isto, porque a partir daquele momento comecei a fantasiar a minha vida caso eu não tivesse largado a Urca pela Gávea. E, quando eu começo com viagens internas, não paro. Imaginei que, como ela, estava indo também para a Unirio, para a primeira aula do dia, às 13h. Sétimo período de artes cênicas, eu poderia estar atrasada para a aula de expressão corporal 6, ou práticas de palhaço, ou ainda, quem sabe, para a aula de FUECT que fui reprovada antes mesmo de fazer a primeira prova, lá naquele primeiro período distante que cheguei a cursar... Não lembro mais o que significa FUECT. Imaginei que poderia ter dormido a manhã inteira, ou então que tivesse saído da aula de dança, de canto, de esgrima para compôr um personagem. Imaginei que poderia estar em cartaz, meu rosto estampado em panfletos espalhados pela cidade. Ou então já poderia estar brilhando na televisão, ou no cinema exigindo nove toalhas verdes-esmeralda no camarim (Avisei sobre as minhas viagens internas, não avisei?). Nesse momento já estava quase arrependida, olhando com compaixão para aquela Eu no ônibus do metrô, saindo da PUC para mais um dia normal de estágio - se é que posso dizer que dias de estágio em jornalismo podem ser normais - quando imaginei, também, que se tivesse continuado na Urca e abandonado a Gávea, eu mal lembraria, ou até nem chegaria a conhecer, pessoas que, hoje, não consigo me ver sem. Fui tentar me imaginar tomando uma cerveja na Voluntários com uma galera que não a minha e não consegui. E aí percebi que eu teria sido bem triste, ou então não teria atingido momentos de felicidade plena, se já não tivesse saído por aí cumprimentando velhinhas que nunca me viram, gritando palavras sem sentido para os carros ao meu redor, testando bíceps aleatórios na Matriz, observando a praia de São Conrado numa noite chuvosa... Talvez jamais teria almoçado no Delírio Tropical, nunca teria parado em Niterói quando o objetivo era pegar a Serra de Petrópolis, também não teria estado em um engarrafamento na Avenida Brasil, apertada num carro com quatro pessoas no banco de trás, e nunca passaria pela minha cabeça sentir saudade de alguém na Noruega... Não precisaria ter ido parar numa reunião dos Narcóticos Anônimos, muito menos ter levado o maior fora da vida de um arcebispo, ou ter entrado num elevador só para conseguir as aspas de uma cineasta famosa...


É certo que, se eu fosse um pouco mais longe na imaginação, poderia, sim, ter fantasiado uma galera superlegal para tomar a cervejinha das sextas. Mas acho que não quis. E quando o ônibus chegou no metrô, saltei feliz na condição atual de Eu.

2 comentários:

O minimalista disse...

Lindo, Marcie! A gente divide o banco de trás de alguns textos. = p

nina lua disse...

ai que lindo, vou chorar!

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