Lá, no sebo, o avaliador parecia cagar para mim e para as histórias dos meus livros. Comecei a me arrepender quando ele pegava meu livro, folheava rapidamente, e escolhia uma das quatro pilhas - que ele acabara de criar - para depositar. Alguns outros, permaneciam na mão daquele peculiar 'avaliador de livros velhos'. Tentei entender o sentido das pilhinhas, mas não consegui. Ziraldo estava na mesma pilha da Narcisa Tamborindeguy, o Tolkien ficou embaixo da Constanza Pascolato, enquanto o Capitão Cueca fazia companhia para Chicó e João Grilo, do Auto da Compadecida. Fui ficando deprimida, me sentindo a mãe que entrega os filhos à adoção. Pensei em mandar ele parar, porque aquilo ali era a minha história, e quem era ele para ir categorizando meus livros daquela forma? Mas permaneci quieta, e percebendo a real, que em breve daria tchau para aqueles títulos e também para a Marcela criança/adolescente que passava tardes e tardes deitada com um livro, ansiando pelas páginas finais. Quando o homem terminou, cinco pilhinhas estavam na minha frente. E veio a sentença: "Te ofereço 50 reais". Respondi um "Tá". E ele pegou quatro livrinhos e me deu: "Esses aqui não me interessam, não". Pensei: "Coitados, renegados até por um sebo", mas disse "Ah, tá bom. Você pode me devolver um das sacolas, então?". Peguei os 50 reais, os títulos renegados e saí da loja um pouco triste, sem dar uma última olhadinha para os meus livros, que já tinham sido tão importantes e hoje cada um valia cerca de R$1,38. Olhei para a sacola nas minhas mãos sem saber o que fazer, e uma vontade de chorar se apossou forte de mim. Me segurei, senão seria ridículo ter que explicar para alguma velhinha do Catete o que aconteceu para uma menina tão bonita estar chorando no meio da rua. Fui andando à esmo, até encontrar um gostinho de alegria numa esfiha da Galeria Condor, e me dar conta de que as minhas memórias valem bem mais do que 50 reais.
sábado, 11 de junho de 2011
Balaio triste
Hoje tive que, obrigada, fazer algo que precisava há muito tempo. Passar adiante livros que me acompanharam na infância e na adolescência, mas que eu já nem olhava mais. Como o móvel que os abrigava vai ser levado para Marataízes, hoje foi o xeque-mate. Acordei e já os vi do lado de fora, entulhando ainda mais um quarto que já é bagunçado. Arregacei as mangas, encontrei o antialérgico e me pus a separar os livros que tentaria vender num sebo, os que mandaria para o meu sobrinho e os que guardaria em outro lugar, porque eu seria incapaz de sobreviver sem a presença de alguns livros que me trazem tantas lembranças boas. "Tchau", da Lygia Bojunga; "Vovó Delícia", do Ziraldo; a coleção do Nelson Motta e os volumes de Harry Potter são alguns dos que nem pensei em me desfazer. Vou deixá-los comigo até que, um dia, quem sabe, meus filhos possam sentir um pouco do prazer que eu senti tocando aquelas folhas cheirosas. Finda a separação, 40 livros seriam levados para a negociação no sebo. Que balaio... A trilogia completa d'O Senhor dos Anéis, que nunca cheguei a terminar, "Férias", da Marian Keyes, tão grande que levei umas férias de verão inteira para ler, minha primeira antologia da Mafalda, a melhor compra por impulso numa feira do livro no colégio... E mais 37.
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Um comentário:
que livros foram rejeitados?
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