quarta-feira, 21 de agosto de 2013

O vinil e a trégua

Não dá para entender muito bem. Desde que eu comprei um toca-discos, não daqueles velhos e imponentes, mas um novo e básico, venho me questionando. É quase que uma dúvida científica. Acho que precisaria estudar a fundo o cérebro humano, córtex pré-frontal e o escambau para estar cara a cara com essa parte obscura de dar valor a hábitos antigos. Isso também quase que me explicaria em um determinado ponto. A verdade é que por algum instante eu gosto de não saber o por quê desse retorno que existe às coisas já superadas. Comprei minha Kansai modelo tampa de acrílico sem alto-falantes não num impulso consumista. Mas de coração aberto à regressão tecnológica. Será?
Em pleno clima de busca por progressão civil e humana (se é que podemos dizer dos que reclamam dos involuídos) surge essa sinapse mal identificada. Tudo bem, existe um momento vintage como tendência do mundo materialista. Quase que uma eterna saudade das coisas criadas antigamente, e uma quase unânime insatisfação com as coisas rápidas e acessíveis como as de hoje. Mas o ponto é exatamente esse. Divagando aqui e ali facilmente se entende que não existe mais graça em algumas experiências antes apreciáveis, justamente pelo acesso ser quase que imediato. E em se tratando de se ouvir música, isso é quase que legítimo. Pois é, e eu falo da experiência.
O meu interesse começou quando eu, nas minhas loucuras sinestésicas, sensoriais (ou mesmo consumistas), passei a me interessar por discos de vinil, por serem acima de tudo objetos físicos, e de certa forma, raros. Isso tem pouco tempo. Na verdade foi uma obsessão saudável que passou primeiro pela minha nova relação com música depois dos vinte, quando eu decidi baixar álbuns inteiros ao invés de músicas soltas de determinada banda (isso é assunto para outra postagem). Sendo a música enquanto matéria, átomos, elétrons, poeira, isso me atraiu de uma tal maneira que eu vi na vitrola uma saída. Não procuro necessariamente mais organicidade sonora na reprodução dos discos, e nem defendo essa vantagem (e não vou parar de ouvir iPod por isso). Muito pelo contrário, se contar que a minha pobre agulha não é tão eficiente na reprodução de graves. Fora que essa tal tampa de acrílico não tem nem apoio para ficar em pé sozinha. Mas não importa, John Lennon está cantando aqui do meu lado, talvez mais vivo do que num iTunes qualquer.
No final das contas, fui descobrindo que é muito mais legal ouvir música dessa forma. Isso porque eu comecei a procurar por ela, como se me escapasse. E de certa forma me escapa. É tanta coisa nova, tanta coisa velha, que os discos de vinil me fazem ter uma atenção mais pontual. Talvez seja isso. A busca por álbuns clássicos e raridades, a herança dos discos de pais e avós, as histórias que eles lembram de cada disco que você puxa, os narizes alérgicos depois de idas a sebos. A dor e a delícia que um 4shared não me dava. De fato, para assegurar meus questionamentos, ainda não respondidos, eu imagino que a despeito de toda a modernidade sempre precisaremos assegurar que nossos prazeres estejam ao alcance. Principalmente para que a efemeridade das coisas as vezes nos deem uma trégua.

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